Carta aberta ao Pai Natal
Todos os anos, por esta altura, apareces por aí todo sorridente, feito herói e com um ar um bocado convencido. Confesso-te que és uma criatura por quem tenho cada vez menos simpatia. E para agravar o meu desagrado, vens cada vez mais cedo. Sabes, não gosto de gente que anda pelos telhados e entra em casa das pessoas pela chaminé.Já foi tempo em que poderás ter sido considerado um encanto. Vinhas então rapidamente numa só noite dar presentes aos meninos pobres. Com o tempo, tornaste-te num velho gordo que se exibe em tudo quanto é canto para tentar impingir sobretudo aquilo que não interessa a ninguém. E como disse, vens cedo, cada vez mais cedo. Ganharás à comissão pelos dias de trabalho?
Lamento desiludir os que ainda acreditam em ti, mas de há uns anos para cá tenho tentado dizer aos adultos e sobretudo às crianças que te tornaste num ladrão. Instalaste-te, roubaste o Natal ao Menino Jesus e agora, talvez pelo espaço que ocupas, não deixas lugar para mais ninguém.
Ora o Natal, pelo menos o meu Natal, é aquele do menino Jesus. Quando era pequenino, mesmo pequenino, desde logo a minha mãe me explicou que o Natal era dele e numa meia, uma meiazinha pequena onde não coubesse muita coisa, o Menino Jesus dava saúde aos pais para nos comprar presentes.
Com o tempo, apareceste tu, um velho com um saco farto e grande; não bastava seres feio, nota-se cada vez mais que já não vens para dar saúde, porque o teu físico é mau exemplo (és barrigudo e mal jeitoso! Deves andar a comer muita comida de plástico e devias saber que isso é um mau exemplo para as crianças.); vens é para vender; vender de tudo e em todo o lado. Até já te vendes a ti mesmo. Já te encontrei por aí a vender fotografias de ti mesmo com crianças ao colo (Já reparaste que algumas até choram por olhar para a tua cara? As tuas barbas não têm piada para todos os meninos!)
Assim sendo, deixa-me dizer-te que se calhar vou arranjar um clube anti-Pai Natal. Digo-te já que pelo menos um número muito considerável de crianças, a quem tenho tentado passar a mensagem, se vão inscrever com muito gosto neste clube. Porque também elas já foram enganadas.
Olha, a mim não me enganas mais. O meu Natal vai continuar a ser o tal do Menino Jesus. E quero-o cá em casa. Se Ele quiser, até pode ficar o ano todo. Agora, tu livra-te de trepar ao meu telhado. Por mim, se caíres este ano e não puderes voltar para o ano tanto melhor para todos.
Artigo de Opinião publicado no Semanário Região de Águeda por João Paulo Sarabando Marques, Pároco da Freguesia de Valongo do Vouga